Vivia perto de uma aldeia um homem, um homem
que era completamente sem sorte. Nada do que ele fazia dava certo.
Muitas vezes ele plantava sementes e o vento vinha e as levava, outras
vezes, era a chuva, que vinha tão violenta e carregava as sementes.
Outras vezes ainda, as sementes permaneciam sob a terra, mas o sol, era
tão quente, que as cozinhava. E ele se queixava com as pessoas e as
pessoas escutavam suas queixas, da primeira vez com simpatia, depois com
um certo desconforto e enfim quando o viam mudavam de caminho, ou
entravam para dentro de suas casas fechando portas e janelas,
evitando-o.
Então além de sem sorte, o homem se tornou chato e
muito só. Ele começou a querer achar um culpado para o que acontecia com
ele. Analisando a situação de sua família percebeu que seu pai era um
homem de sorte, sua mãe, esta tinha sorte por ter se casado com seu pai,
e seus irmãos eram muito bem sucedidos, pois então, se não era um caso
genético, só poderia ser coisa do Criador. E depois de muito pensar
resolveu tomar uma atitude e ir até o fim do mundo falar com o Criador,
que como Criador de tudo, deveria ter uma resposta.
Arrumou sua malinha, algum alimento e partiu rumo ao
fim do mundo. Andou um dia, um mês, um ano e um dia, e pouco antes de
entrar numa grande floresta ouviu uma voz:
- Moço, me ajude. Ele
então olhou para os lados procurando alguém. Até que se deparou com um
lobo, magro, quase sem pelos, era pele e osso o infeliz. Dava para
contar suas costelas.
Ele falou:
- Há três meses estou nesta situação. Não sei o que está acontecendo comigo. Não tenho forças para me levantar daqui.
O homem refeito do susto respondeu:
- Você está
se queixando a toa... Eu tive azar a vida inteira. O que são três meses?
Mas faça como eu. Procure uma resposta. Eu estou indo procurar o
Criador para resolver o meu problema.
- Se eu não tenho forças nem para ir ao rio beber
água... Faça este favor para mim. Você está indo vê-lo, pergunte o que
está acontecendo comigo. O homem fez um sinal de insatisfação e disse
que estava muito preocupado com seu problema, mas se lembrasse,
perguntaria. Virando as costas, continuou seu caminho.
Andou um dia, um mês, um ano e um dia e de repente, ao tropeçar numa raiz, ouviu:
-
Moço, cuidado. E quando olhou, viu uma folhinha que vinha caindo,
caindo; Olhando para cima, viu a árvore com apenas duas folhinhas.
Levantou-se e observando suas raízes desenterradas, seus galhos retorcidos, sua casca soltando-se do tronco, falou:
- Você não se envergonha? Olhe as outras árvores a sua volta e diga se você pode ser chamada de árvore? Conserte sua postura.
A árvore, com uma voz de muita dor, disse:
- Não
sei o que está acontecendo comigo. Estou me sentindo tão doente. Há seis
meses que minhas folhas estão caindo, e agora, como vês, só restam
duas... E, no fim de uma conversa, pediu ao homem que procurasse uma
solução com o Criador.
Contrariado, o homem virou as costas com mais uma
incumbência. Andou um dia, um mês, um ano e um dia e chegou a um vale
muito florido, com flores de todas as cores e perfumes. Mas o homem não
reparou nisto. Chegou até uma casa e na frente da casa estava uma moça
muito bonita que o convidou a entrar.
Eles conversaram longamente e quando o homem deu por
si já era madrugada. Ele se levantou dizendo que não podia perder tempo e
quando já estava saindo ela lhe pediu um favor:
- Você que vai
procurar o Criador, podia perguntar uma coisa para mim? É que de vez em
quando sinto um vazio no peito, que não tem motivo, nem explicação.
Gostaria de saber o que é e o que posso fazer por isto.
O homem prometeu que perguntaria e virou as costas e
andou um dia, um mês, um ano e um dia e chegou por fim ao fim do mundo.
Sentou-se e ficou esperando até que ouviu uma voz. E uma voz no fim do
mundo, só podia ser a voz do criador...
- Tenho muitos nomes. Chamam-me também de Criador...
E o homem contou então toda a sua triste vida.
Conversou longamente com a voz até que se levantou e virando as costas
foi saindo, quando a voz lhe perguntou:
- Você não está se esquecendo de nada? Não ficou de saber respostas para uma árvore, para um lobo e para uma jovem?
- Tem razão... E voltou-se para ouvir o que tinha que ser dito.
Depois de um tempinho virou-se e correu... mais
rápido que o vento até que chegou na casa da jovem. Como ela estava em
frente à casa, vendo-o passar chamou:
- Ei!!! Você conseguiu encontrar o Criador? Teve as respostas que queria?
- Sim!!! Claro! O Criador disse que minha sorte está há muito no mundo. Basta ficar alerta para perceber a hora de apanhá-la!
- E quanto a mim, você teve a chance de fazer a minha pergunta?
- Ah! O Criador disse que o que você sente é solidão.
Assim que encontrar um companheiro vai ser completamente feliz, e mais
feliz ainda vai ser o seu companheiro.
A jovem então abriu um sorriso e perguntou ao homem se ele queria ser este companheiro.
- Claro que não... Já trouxe a sua resposta... Não
posso ficar aqui perdendo tempo com você. Não foi para ficar aqui que
fiz toda esta jornada. Adeus!!!
Virando as costas, correu mais rápido do que a água, até a floresta onde estava a árvore. Ele nem se lembrava dela.
Mas
quando novamente tropeçou em sua raiz, viu caindo uma última folhinha.
Ela perguntou se ele tinha uma resposta, ao que o homem respondeu:
- Tenho muita pressa e vou ser breve, pois estou indo em busca de minha sorte, e ela está no mundo.
O Criador disse que você tem embaixo de suas raízes
uma caixa de ferro cheia de moedas de ouro. O ferro desta caixa está
corroendo suas raízes. Se você cavar e tirar este tesouro daí vai
terminar todo o seu sofrimento e você vai poder virar uma árvore
saudável novamente.
- Por favor!!! Faça isto por mim!!! Você pode ficar
com o tesouro. Ele não serve para mim. Eu só quero de novo minha força e
energia. O homem deu um pulo e falou indignado:
- Você está me
achando com cara de quê? Já trouxe a resposta para você. Agora resolva o
seu problema. O Criador falou que minha sorte está no mundo e eu não
posso perder tempo aqui conversando com você, muito menos sujando minhas
mãos na terra.
Virando as costas correu, mais rápido do que a luz,
atravessou a floresta, e chegou onde estava o lobo, mais magro ainda e
mais fraco.
O homem se dirigiu a ele apressadamente e disse:
-
O Criador mandou lhe falar que você não está doente. O que você tem é
fome. Está a morrer de inanição, e como não tem forças mais para sair e
caçar, vai morrer aí mesmo. A não ser, que passe por aqui uma criatura
bastante estúpida, e você consiga comê-la.
Nesse momento, os olhos do lobo se encheram de um
brilho estranho, e reunindo o restante de suas forças, o lobo deu um
pulo e comeu o homem "sem sorte".
"SOMOS O QUE FAZEMOS, MAS SOMOS PRINCIPALMENTE
O QUE FAZEMOS PARA MUDAR O QUE SOMOS".
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