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Allahur Akbar! Allahur Akbar! (Deus é grande! Deus é grande!)
Quando Deus criou a mulher criou também a fantasia. Um dia a Verdade
resolveu visitar um grande palácio. E havia de ser o próprio palácio em
que morava o sultão Harun Al-Raschid.
Envolta em lindas formas num
véu claro e transparente, foi ela bater à porta do rico palácio em que
vivia o glorioso senhor das terras mulçumanas. Ao ver aquela formosa
mulher, quase nua, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Verdade! - respondeu ela, com voz firme. - Quero falar ao vosso
amo e senhor, o sultão Harun Al-Raschid, o Xeique do Islã!
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, apressou-se em levar a nova ao grão-vizir:
- Senhor, - disse, inclinando-se humilde, - uma mulher desconhecida,
quase nua, quer falar ao nosso soberano, o sultão Harun Al-Raschid,
Príncipe dos Crentes.
- Como se chama?
- Chama-se a Verdade!
- A Verdade! - exclamou o grão-vizir, subitamente assaltado de grande
espanto. - A Verdade quer penetrar neste palácio! Não! Nunca! Que seria
de mim, que seria de todos nós, se a Verdade aqui entrasse? A perdição, a
desgraça nossa! Dize-lhe que uma mulher nua, despudorada, não entra
aqui!
Voltou o chefe dos guardas com o recado do grão-vizir e disse à Verdade:
- Não podes entrar, minha filha. A tua nudez iria ofender o nosso
Califa. Com esses ares impudicos não poderás ir à presença do Príncipe
dos Crentes, o nosso glorioso sultão Harun Al-Raschid. Volta, pois,
pelos caminhos de Allah!
Vendo que não conseguiria realizar o seu
intento, ficou muito triste a Verdade, e afastou-se lentamente do grande
palácio do magnânimo sultão Harun Al-Raschid, cujas portas se lhe
fecharam à diáfana formosura!
Mas...
Allahur Akbar! Allahur Akbar!
Quando Deus criou a mulher, criou também a Obstinação. E a Verdade
continuou a alimentar o propósito de visitar um grande palácio. E havia
de ser o próprio palácio em que morava o sultão Harun Al-Raschid...
Cobriu as peregrinas formas de um couro grosseiro como os que usam os
pastores e foi novamente bater à porta do suntuoso palácio em que vivia o
glorioso senhor das terras mulçumanas.
Ao ver aquela formosa mulher grosseiramente vestida com peles, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Acusação! - respondeu ela, em tom severo. - Quero falar ao
vosso amo e senhor, o sultão Harun Al-Raschid, Comendador dos Crentes!
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, correu a entender-se como o grão-vizir.
- Senhor - disse, inclinando-se humilde, - uma mulher desconhecida, o
corpo envolto em grosseiras peles, deseja falar ao nosso soberano, o
sultão Harun Al-Raschid.
- Como se chama?
- A Acusação!
-
A Acusação? - repetiu o grão-vizir, aterrorizado. - A Acusação quer
entrar nesse palácio? Não! Nunca! Que seria de mim, que seria de todos
nós, se a Acusação aqui entrasse! A perdição, a desgraça nossa! Dize-lhe
que não, que não pode entrar! Dize-lhe que uma mulher, sob as vestes
grosseiras de um zagal, não pode falar ao Califa, nosso amo e senhor!
Voltou o chefe dos guardas com a proibição do grão-vizir e disse à Verdade.
- Não podes entrar, minha filha. Com essas vestes grosseiras, próprias
de um beduíno rude e pobre, não poderás falar ao nosso amo e senhor, o
sultão Harun Al-Raschid. Volta, pois, em paz, pelos caminhos de Allah!
Vendo quem não conseguiria realizar o seu intento, ficou ainda mais
triste a Verdade e afastou-se vagarosamente do grande palácio do
poderoso Harun Al-Raschid, cuja cúpula cintilava aos últimos clarões do
sol poente.
Mas...
Allahur Akbar! Allahur Akbar!
Quando
Deus criou a mulher, criou também o Capricho. E a Verdade entrou-se do
vivo desejo de visitar um grande palácio. E havia de ser o próprio
palácio em que morava o sultão Harun Al-Raschid.
Vestiu-se com
riquíssimos trajos, cobriu-se com jóias e adornos, envolveu o rosto em
um manto diáfano de seda e foi bater à porta do palácio em que vivia o
glorioso senhor dos Árabes.
Ao ver aquela encantadora mulher, linda como a quarta lua do mês de Ramadã, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Fábula - respondeu ela, em tom meigo e mavioso. - Quero falar
ao vosso amo e senhor, o generoso sultão Harun Al-Raschid, Emir dos
Árabes!
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, correu, radiante, a falar com o grão-vizir:
- Senhor, - disse, inclinando-se, humilde - uma linda e encantadora
mulher, vestida como uma princesa, solicita audiência de nosso amo e
senhor, o sultão Harun Al-Raschid, Emir dos Crentes.
- Como se chama?
- Chama-se a Fábula!
- A Fábula! - exclamou o grão-vizir, cheio de alegria. - A Fábula quer
entrar neste palácio! Allah seja louvado! Que entre! Bem-vinda seja a
encantadora Fábula: Cem formosas escravas irão recebê-la com flores e
perfumes! Quero que a Fábula tenha, neste palácio, o acolhimento digno
de uma verdadeira rainha!
E abertas de par em par as portas do grande palácio de Bagdá, a formosa peregrina entrou.
E foi assim, sob o aspecto de Fábula, que a Verdade conseguiu aparecer
ao poderoso califa de Bagdá, o sultão Harun Al-Raschid, Vigário de Allah
e senhor do grande império mulçumano!
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